Por Andressa Antunes
O debate sobre o impacto da disseminação de informações falsas em redes sociais se intensifica a cada ano no Brasil. O termo fake news, que inundou grande parte das timelines do Twitter a partir da eleição de 2018, agora não é somente tema de discussões na internet: com a pandemia, se tornou também pauta de reivindicações ligadas a ciência, política e legislação das redes sociais.
Nas últimas semanas, o Twitter foi alvo de denúncias por parte de usuários da plataforma através de uma avalanche de tweets com as hashtags #TwitterApoiaFakeNews, #TwitterOmisso e #TwitterCúmplice. Com milhares de menções à rede social, os questionamentos sobre a política da empresa de combate à desinformação a respeito da Covid-19 resultaram até mesmo na atuação do Ministério Público Federal.
A movimentação liderada por acadêmicos, jornalistas, pesquisadores e atores políticos se concentrou em três pontos:
- A então ausência de uma ferramenta de denúncia de conteúdos desinformativos sobre a pandemia, já em funcionamento em países como os Estados Unidos e a Austrália;
- A falta de transparência na política de verificação de usuários, após a plataforma conceder o selo azul à blogueira bolsonarista Barbara Destefani — citada no relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia dentre as contas que disseminaram fake news sobre a Covid-19;
- A não remoção de tweets que contestam a eficácia das vacinas contra o novo coronavírus, inclusive publicados por contas verificadas.
Após pressão dos usuários, o MPF se posicionou. Em ofício enviado ao Twitter na tarde do dia 6 de janeiro, o procurador da República em São Paulo Yuri Corrêa Luz solicitou que a empresa respondesse em até 10 dias sobre a disponibilização de recurso para denúncias de conteúdos desinformativos sobre a Covid-19; o porquê de usuários de outros países já possuírem uma via de denúncia para conteúdos deste tipo e os brasileiros, até então, não; se estavam sendo adotadas providências para que esta ferramenta fosse implementada no Brasil e, em caso positivo, qual o prazo para o início do seu funcionamento; e também a descrição de quais critérios são analisados para a concessão de verificação para usuários brasileiros, indicando se entre os fatores que levam à negação do selo azul está o compartilhamento de informações falsas sobre a pandemia.
No mesmo dia, a rede social também publicou um posicionamento. Em uma série de tweets através do perfil @TwitterSeguroBR, a empresa esclareceu alguns pontos sobre os questionamentos levantados pelos usuários.
Temos acompanhado as discussões sobre nossa atuação para conter a desinformação no Twitter, especialmente relacionada a Covid-19. Enquanto avaliamos internamente revisões em nossos processos e análises, gostaríamos de esclarecer alguns pontos.
— Twitter Seguro 🇧🇷 (@TwitterSeguroBR) January 6, 2022
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Em um primeiro momento, o esclarecimento não foi suficiente. Usuários questionaram a ideia de que o Twitter “tem o desafio de não arbitrar a verdade e dar às pessoas que usam o serviço o poder de expor, contrapor e discutir perspectivas”, uma vez que o negacionismo não pode ser tratado pela empresa como uma opinião ou ponto de vista.
No entanto, após quase duas semanas do início da movimentação dos usuários, o Twitter adicionou a ferramenta para denúncias de fake news no Brasil — sejam elas sobre a Covid-19 ou qualquer outro tema. Segundo a empresa, desde o início dos testes em agosto de 2021 na Austrália, Estados Unidos e na Coreia do Sul, foram realizadas 3,73 milhões de denúncias referentes a 1,95 milhão de diferentes tuítes publicados em 64 mil contas diferentes e que “menos de 10% da amostra de tuítes analisada pelas equipes correspondia a violações às políticas”.
O que muda?
Agora, ao clicar na opção de Denunciar Tweet, os usuários brasileiros têm acesso à opção As informações são enganosas e, ao clicar neste item, abre-se uma lista de categorias — Política, Saúde e Outra coisa.
A plataforma ainda destaca a seguinte informação:
“Levamos sua opinião a sério. Ainda que não seja tomada nenhuma ação por conta desta denúncia nem enviada uma resposta diretamente a você, usaremos esta denúncia para desenvolver novas formas de reduzir informações enganosas. Isso pode incluir limitação da visibilidade, contextualização adicional e criação de novas políticas”.
Em mais uma série de tweets, o head de Site Integrity do Twitter, Yoel Roth, esclareceu informações sobre os testes e os resultados obtidos pela plataforma até então. Além do Brasil, a Espanha e as Filipinas também foram escolhidas porque a plataforma quer “colher aprendizados de uma pequena, porém geograficamente diversificada, gama de regiões” antes de tornar a ferramenta disponível no mundo todo, segundo a empresa.
We’re expanding our misinformation reporting pilot to three new countries: Brazil, Spain, and the Philippines.
— Yoel Roth (@yoyoel) January 17, 2022
Here’s some of what we’ve learned from the more than 3.7 million misinformation reports filed so far, and why we’re continuing with an experimental approach… 🧵 https://t.co/f099ga8GUN
Combate às fake news é prioridade no ano eleitoral
A disseminação de notícias falsas não é somente uma ameaça à saúde, mas também à democracia. Desde as eleições presidenciais de 2018, o disparo massivo de informações falsas através de redes sociais e aplicativos de mensagem se tornou uma das grandes preocupações da Justiça Eleitoral. Enquanto a legislação avança a passos lentos, o potencial de disseminação das fake news através da internet apenas cresce. Em 2022, uma nova plataforma se tornará o centro das discussões sobre o combate à desinformação: o Telegram, app de mensagens que permite a criação de canais sem limite de pessoas e grupos de até 200 mil usuários, já é alvo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Segundo informações do Jornal Valor e O Globo, o TSE estuda banir o programa como forma de reduzir o terreno fértil para disseminação de fake news no Brasil. Caso a medida se concretize, a Corte pode determinar a remoção do Telegram das lojas de aplicativos ou, mais incisivamente, interromper o funcionamento da plataforma em todo o território nacional.
Enquanto em 2018 o aplicativo estava presente em 15% dos telefones do Brasil, em agosto de 2021 o índice chegou a 53% — e, por não possuir representantes no País, a empresa fica fora do alcance da Justiça. Apurações de jornalistas de grandes veículos comprovaram a disseminação de conteúdos nocivos, como vídeos de violência extrema, venda de armamentos e pornografia infantil. Além disso, o compartilhamento direto de informações falsas em um canal privado de comunicação dificulta até a ação das agências de checagem.
Neste cenário, o WhatsApp também é considerado uma ameaça. Ainda segundo informações de O Globo, a empresa realiza testes internos para a derrubada dos limites hoje impostos na plataforma para a publicação de mensagens em grupos (que, atualmente, é limitado a 256 pessoas). A possibilidade de uma maior disseminação de informações falsas preocupa especialistas e também a Justiça Eleitoral, principalmente com a aproximação das eleições presidenciais.
“Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado e as pessoas vão para a cadeia”
Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes durante julgamento da ação que pedia a cassação da chapa Jair Bolsonaro – Hamilton Mourão, sob a acusação de disparos em massa de informações enganosas.Saiba como identificar e frear a transmissão de notícias falsas
No cenário de crise causada pela pandemia e as eleições, o desconhecimento do público se torna um catalisador para a disseminação de fake news. Por isso, identificar conteúdos enganosos e agir de maneira correta para frear o seu compartilhamento são ações essenciais para os usuários de redes sociais. Confira:
- Desconfie de absurdos: consumir informações na era das fake news exige senso crítico. Notícias muito absurdas tendem a ser falsas e necessitam de uma ação de checagem incisiva.
- Confira o conteúdo completo: Ao receber ou visualizar notícias através das redes sociais ou aplicativos de mensagens, não visualize apenas a manchete. Observar todo o conteúdo com atenção é essencial para a identificação de inconsistências e inverdades.
- Cheque o link: Um site desconhecido não é, necessariamente, reprodutor de fake news. No entanto, ficar atento à produção de conteúdo por organizações e meios de comunicações ilegítimas ou que tentam se passar por empresas conhecidas e confiáveis é indispensável.
- Diferencie opiniões de fatos: O uso de fontes confiáveis, como estudos e pesquisas feitos por Instituições renomadas, é essencial para a produção de conteúdos jornalísticos de qualidade. Ao observar a ausência destes materiais ou o uso de opiniões como fontes, desconfie.
Ao identificar conteúdos falsos, não compartilhe. Para frear a disseminação de desinformação, realize denúncias através de redes sociais e sugira uma verificação. Conversar com quem compartilhou o conteúdo, em tom amistoso, também pode ser uma opção.